segunda-feira, 26 de dezembro de 2016

Ceará registra 813 fugas nos últimos dois anos

Em maio deste ano, uma série de rebeliões em penitenciárias da Região Metropolitana de Fortaleza resultou em 14 mortes ( Foto: Natinho Rodrigues )
00:00 · 26.12.2016
A crise no Sistema Penitenciário do Ceará em 2016 foi sem dúvidas a maior da história. Uma sequência de rebeliões ocorridas, em maio, no Complexo Penitenciário de Itaitinga terminou com o saldo trágico de 14 detentos mortos e diversas unidades prisionais praticamente destruídas. No entanto, um relatório do Conselho Nacional do Ministério Público mostra que nos anos anteriores, o Ceará já não ia bem. Em 2015, o Estado registrou os maiores números de fugitivos (361) e de rebeliões (27) dentre os Estados do Nordeste. Em 2016, já são 452 fugitivos, dos quais 180 foram recapturados, segundo levantamento da Secretaria de Justiça e Cidadania (Sejus) até o mês de novembro deste ano.
Outros problemas foram identificados pelo Ministério Público durante as inspeções realizadas nas 132 unidades prisionais cearenses, nos anos de 2014 e 2015. Embora a Sejus não confirme e até tenha negado, em algumas oportunidades, a atuação de facções criminosas dentro dos presídios, o documento apontou que, em 2015, havia facções identificadas em 16 unidades prisionais do Ceará. Tanto em 2014, quanto em 2015 o Estado foi o segundo do Nordeste em número de mortes nos presídios.
A superlotação das penitenciárias e cadeias públicas também se mostra grave. Nas primeiras, a superlotação era de 54%, em 2015, e nas cadeias de 71%. Em 2016, conforme a Sejus, existem 12.043 vagas ao todo para um total de 20.232 pessoas recolhidas no Sistema.
O relatório revelou também que o Estado nordestino com o maior número de casos de maus-tratos contra presos, praticados por servidores, no último ano analisado, foi o Ceará. Os agentes penitenciários, que diversas vezes reclamaram da situação do Sistema e chegaram a deflagrar a greve que a Sejus considera motivadora da sequência de rebeliões de maio, não têm, sequer, alojamentos adequados. Conforme o documento, em 36% das unidades vistoriadas, a situação desses alojamentos eram consideradas ruins.
Segundo o Ministério Público, faltam vagas em todos os regimes no Ceará: fechado, semiaberto, aberto e também para presos provisórios e para quem cumpre medidas de segurança. Os presos provisórios são, na verdade, um 'gargalo', para a Sejus. Em 2015, havia 2.959 vagas para prisioneiros provisórios, mas o Estado do Ceará custodiava 9.129 pessoas que ainda aguardavam julgamento.
Estrutura
A situação física dos presídios também não é boa. O documento do Conselho Nacional do MP diz que de 132 unidades analisadas no Ceará, apenas 19 ofereciam camas para todos os presos e 54 oferecem material para higiene pessoal. Grande parte das unidades apresentam estrutura predial (54%), iluminação (47%) e insolação das celas (48%) consideradas ruins.
As unidades prisionais cearenses também tiveram 80% das instalações elétricas, 88% das instalações sanitárias e 45% das instalações de saúde consideradas regulares ou ruins. O presidente do Sindicato dos Agentes Penitenciários do Ceará (Sindasp-CE), Valdemiro Barbosa, disse que a Instituição já conhecia a situação e havia feito alertas ao Governo. Segundo ele, a situação do Sistema é "dramática". Segundo Barbosa, o avanço do crime organizado no Brasil como um todo e, especialmente, no Ceará, tem agravado muito a situação. "O problema se agravou de 2015 para cá, porque as penitenciárias foram sendo deterioradas e o crime organizado se estabeleceu lá dentro aproveitando da ausência do Estado. As facções ocuparam o espaço deixado pelo Governo e são elas que dão as ordens dentro das penitenciárias e praticam todo tipo de coisa ilícita".
Valdemiro Barbosa disse, ainda, que a superlotação e o efetivo reduzido de agentes são pontos fundamentais para o que considerou "desorganização e caos" nas unidades. "Nas grandes penitenciárias, um espaço construído para seis pessoas tem 15 e até 18 custodiadas de maneira totalmente desumana. Em contrapartida, nós temos de plantão, diariamente, cerca de 350 agentes penitenciários. É humanamente impossível um agente conseguir fazer seu trabalho de fiscalização e ressocialização, com cerca de 280 presos sob a responsabilidade dele, quando o recomendado são apenas cinco".
A Secretaria da Justiça disse que "refuta os dados da pesquisa e as comparações entre os estados nordestinos, tendo em vista que o Ceará teve número bastante superior de estabelecimentos inspecionados ao longo do ano de 2015 pelo MP. Foram 132 dos seus 158 estabelecimentos prisionais visitados, enquanto os demais tiveram, em média 31 unidades visitadas". Conforme a Pasta, em Pernambuco, 77 estabelecimentos foram visitados. No entanto, o estado tem o maior número de presos no Nordeste, segundo dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), do Ministério da Justiça (MJ).
Metodologia
A Pasta afirmou desconhecer a metodologia utilizada pela entidade para aferir os dados, bem como a origem de informações divulgadas, a exemplo do número de maus-tratos e de rebeliões com reféns. Questionou informações como a falta de materiais de higiene e colchões. Destacou que o "Estado, além de fornecer esses materiais, autoriza a entrada dos mesmos pelos familiares dos internos".
Segundo a Secretaria, ações têm sido realizadas para reduzir o encarceramento, além da inauguração de novas unidades prisionais. No último mês de novembro, foi inaugurada um presídio com mais de mil vagas. Conforme a Sejus, novos equipamentos de segurança foram entregues às unidades prisionais. Além disso, vistorias e outras operações foram realizadas para coibir o uso de ilícitos nos últimos dois anos. Por fim, disse que foi sancionada a Lei do Abono que aumentou o número de agentes penitenciários nos estabelecimentos prisionais.

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