sábado, 28 de janeiro de 2017

Falta de transporte dificulta tratamento da microcefalia


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O Núcleo de Estimulação Precoce da Policlínica de Iguatu atende crianças com microcefalia no Centro-Sul do Estado ( Foto: Honório Barbosa )
Iguatu. A microcefalia associada ao vírus Zika assombrou o Brasil, em particular as grávidas, a partir de casos que surgiram em 2015, principalmente na região Nordeste. O tratamento das crianças diagnosticadas com a doença no Ceará passou a ser feito desde julho de 2016 nas 19 policlínicas regionais, a partir da criação de Núcleos de Estimulação Precoce por equipes multiprofissionais, mas a principal queixa das mães é a dificuldade de transporte.
Em 2016, foram confirmados 16 casos de microcefalia associada ao vírus Zika e 111 estão em investigação. No ano de 2015, foram 56 confirmados e mais 40 em investigação, segundo boletim da Secretaria da Saúde do Estado. Atualmente, 96 crianças com a doença estão em tratamento na rede de policlínicas regionais.
Antes de julho de 2016, as mães precisavam se deslocar até Fortaleza em busca de atendimento especializado no Núcleo de Tratamento e Estimulação Precoce do Ceará, serviço de extensão da Universidade Federal do Ceará (UFC). Os transtornos eram maiores. Surgiu então a ideia de treinar profissionais e abrir núcleos semelhantes nas 19 policlínicas nas cidades de Acaraú, Aracati, Barbalha, Baturité, Brejo Santo, Camocim, Campos Sales, Caucaia, Crateús, Icó, Iguatu, Itapipoca, Limoeiro do Norte, Pacajus, Quixadá, Russas, Sobral, Tauá e também em Tianguá.
Nessas unidades, por decisão do governo do Estado, foram criados Núcleos de Estimulação Precoce, em meados de 2016, mediante a necessidade impulsionada pelo crescimento da demanda. Esses espaços atendem crianças com distúrbios do desenvolvimento neuropsicomotor, como a microcefalia, paralisia cerebral, síndrome de Down, prematuras, e outros casos neurológicos.
O atendimento é feito por uma equipe formada por fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, fonoaudióloga e psicóloga. Para receber o atendimento na policlínica, o paciente precisa ser encaminhado pela secretaria de Saúde do município. Quando a criança mora em outra cidade, ocorre muitas vezes a dificuldade de deslocamento. Na região Centro-Sul, esse problema ainda não se verifica porque há ônibus do Sistema de Transporte Sanitário, que diariamente trazem os pacientes pela manhã e tarde. Entretanto, há queixa na região de Sobral e de Quixadá.
Atendimento
A fisioterapeuta do Núcleo de Estimulação Precoce da Policlínica Regional de Iguatu, Márcia Belém, disse que a unidade atende duas vezes por semana crianças até dois anos de idade. "Temos três crianças com microcefalia, sendo uma de Iguatu, uma de Mombaça e outra de Piquet Carneiro", frisou. "A nossa expectativa é que essas crianças se desenvolvam, mas ainda é uma incógnita os casos de microcefalia por Zika Vírus".
Sobral
É no Núcleo de Estimulação Precoce da Policlínica Bernardo Félix da Silva, que o pequeno Jesus Emanuel Rodrigues, de 11 meses de vida, vem duas vezes por semana para o atendimento com uma equipe multiprofissional. O trabalho de fisioterapia, terapia ocupacional, neurologia, pediatria e fonoaudiologia tem ajudado a criança em seu desenvolvimento neurológico.
Jesus Rodrigues tem microcefalia, diagnóstico confirmado pelo médico logo no nascimento da criança, que já apresentava sinais da doença, ainda no ventre da mãe, aos oito meses de gestação.
O choque inicial da notícia abalou a mãe, a dona de casa Joane Rodrigues, 18 anos, que já tinha um primeiro filho, mas a jovem encarou a questão com coragem e iniciou o tratamento, com pleno apoio da família, quando o caçula completou quatro meses. "Eu nunca achei que isso fosse acontecer comigo, mas, com o tempo, os dias de atendimento têm trazido melhorias para ele, que já consegue se alimentar direito e realizar mais movimentos com o corpo", disse. "Para nós dois, cada dia é uma vitória".
Essa batalha semanal, que mãe e filho enfrentam juntos, também conta com apoio da equipe do Núcleo de Serviço Social e Psicologia da Policlínica, que a cada trinta dias faz avaliação dos pacientes em tratamento. Ao todo, 14 crianças têm sido tratadas por conta da microcefalia, oriundas de municípios como Coreaú, Forquilha, Frecheirinha, Irauçuba, além de Sobral.
Transporte
Por dia, deveriam ser atendidas dez crianças, encaminhadas pelas secretarias de Saúde dos municípios de origem, mas de acordo com a diretora geral da Policlínica, Andréa Linhares, o número é reduzido pela metade. "Existe dificuldade de transporte para as famílias de outros municípios", explicou. "Isso vem sendo relatado pelas mães, quando se percebe a falta ao tratamento. Até aqui, esse tem sido o único problema".
Ainda de acordo com a diretora geral, mesmo que as mães tenham a orientação sobre a maneira correta de estimular seus filhos, em casa, quando não existe a possibilidade de vir ao Núcleo, é importante que tenha a ajuda de profissionais, para que haja uma plena estimulação da criança. "Uma das ideias de ampliação desse serviço é que possamos treinar as equipes de estratégia do Programa Saúde da Família em cada município, para que esse acompanhamento também seja feito em cada localidade", adiantou. "A nossa expectativa é que, até junho deste ano, estejamos com esse apoio em cada território".
Encaminhamento
Em Sobral, quando há suspeita de microcefalia, o bebê é encaminhado à Policlínica para que se tenha o diagnóstico que comprove a doença, além de passar por avaliação pediátrica, tomografia de crânio, teste oftalmológico, consulta com fonoaudiólogo, atendimento com neurologista e outros exames clínicos que levam, em média, uma semana para se ter a conclusão.
Sertão Central
A policlínica que atende aos municípios do Sertão Central fica em Quixadá. A unidade abrange os municípios da 8ª Região de Saúde, como Banabuiú, Choró, Ibaretama, Ibicuitinga, Milhã, Quixadá, Quixeramobim, Senador Pompeu e Solonópole. Mães destas cidades que necessitam de consulta na região precisam se deslocar até a cidade e algumas vezes encontram algumas dificuldades.
A dona de casa Clara Dalva de Freitas, moradora de Banabuiú, relatou que até o fim do ano encontrava problemas para levar o filho com microcefalia para o tratamento na Policlínica de Quixadá. Ela relata que demorava para conseguir marcar as consultas pelo sistema e, quando conseguia, faltava transporte para ir até Quixadá.
"Era uma peleja para conseguir uma vaga. Quando dava certo, faltava o transporte. Eu perdia a consulta, né? Não era todo dia que eu tinha dinheiro para pagar uma Van. Ficava muito chateada porque eu perdia a chance de consultar meu filho mas, fazer o quê fazer, né?".
Algumas dificuldades são relatadas por moradores de Milhã. Eles também reclamam que a questão do transporte era um dos principais entraves para que conseguissem ir às consultas. A marcação acontecia, mas no dia não tinha carro disponível.
SAIBA MAIS
A microcefalia é uma malformação congênita, em que o cérebro não se desenvolve de maneira adequada. Pode ser causada por bactérias, vírus e radiação
Os bebês nascem com perímetro cefálico menor que o normal, com medida menor ou igual a 31,5cm para meninas e 31,9 para meninos
Em novembro de 2015, o Ministério da Saúde confirmou a relação entre o vírus Zika e a microcefalia
O vírus Zika é transmitido pela picada do mesmo vetor da dengue e chikungunya, o Aedes aegypti
A relação entre o vírus e a ocorrência de microcefalia confirmada por exames no Instituto Evandro Chagas, em novembro de 2015, era uma situação inédita na pesquisa científica mundial

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