segunda-feira, 23 de setembro de 2013

CRATO: Devotos acompanham Romaria ao Sítio Caldeirão


Os primeiros romeiros chegaram cedo. Por volta das 6 horas da manhã já era possível perceber o deslocamento dos fiéis que residem nas proximidades do Caldeirão deSanta Cruz do Deserto, local onde no final da década de 20 o beato José Lourenço, juntamente com seus seguidores, formou um povoado voltado à prática do bem comum e com sistema econômico próprio, onde tudo ali produzido era repartido de forma igualitária na tentativa de diminuir a fome daquela população já sofrida pela falta de água, devido à seca que se instalava na região.
Ontem, os problemas superados por aquela comunidade voltaram a ser lembrados durante a realização da 14ª Romaria ao Caldeirão do Beato Zé Lourenço.Com o tema “Terra, Água, Comunhão – Bem Viver no Nosso Chão”, representantes de diversas comunidades, entidades de classe e sociedade civil organizada, expuseram suas preocupações sobre a falta de política pública que garanta o bem-estar social junto as populações camponesas. Eles observaram ainda a necessidade de criação de mecanismos de atendimento às reivindicações da população que continua prejudicada pela falta de água, saúde, educação, moradia, dentre outras necessidades.
O evento, realizado anualmente pela Diocese de Crato, através da Comissão Pastoral da Terra (CPT), reuniu religiosos de 15 municípios da região. Caravanas dos Estados da Paraíba, Piauí, Pernambuco e Bahia também estiveram presentes à romaria. Para muitos o cortejo não significa apenas um momento de fé e adoração. Também é visto como tempo de aproximação entre os sertanejos e de renovação da esperança de dias melhores para o homem do campo.
“Significa o resgate da força das comunidades eclesiais de base e dos movimentos populares. Fortalece a militância marcada pelo compromisso com a vida e a manutenção do legado deixado pela própria comunidade do Caldeirão do beato Zé Lourenço, para que ela possa ecoar em todas as nossas comunidades a partir da força da nossa organização”, avalia padre Vileci Vidal, coordenador do CPT do Crato e responsável pela celebração realizada ontem aos romeiros.
Durante a celebração, diversos temas sociais foram levantados pelos religiosos. Dentre os assuntos debatidos, a necessidade do desenvolvimento de programas ecológicos, como forma de fortalecimento das comunidades, foi o que mais chamou a atenção dos presentes. “Nós precisamos reestruturar a vida. A sociedade está um tanto quanto acomodada às questões sociais. As questões ecológicas já eram discutidas à época do Caldeirão. Precisamos resgatar esse debate, dentre muitos outros temas”, ratificou padre Vidal.
A comunidade de Gravatá, localizada na zona rural de Caririaçu foi lembrada durante as discussões. No local deverá ser construído o aterro sanitário que atenderá alguns municípios da região. A população que lá reside, no entanto, é contrária a obra. Afirma que os reservatórios hídricos ali existentes serão contaminados com o funcionamento do aterro e que as áreas de plantio serão prejudicadas.
“Todos estes projetos que ocasionem prejuízo às comunidades produtivas necessitam ser revistos. É isso que nós também estamos debatendo na romaria”, explicou o religioso.
Homenagens
Após a missa, um grupo de vaqueiros prestou referências a figuras religiosas que se destacam na região, como por exemplo: o padre Cícero Romão Batista, o padre Inácio de Loyola e o fundador da comunidade do Caldeirão de Santa Cruz do Deserto beato Zé Lourenço.
O vaqueiro Raimundo Procópio realizou o tradicional aboio em homenagem ao beato Zé Lourenço. Ele liderou um grupo de cavaleiros que acompanhou o cortejo desde logo cedo. “Todos os anos nós gostamos de participar desta romaria. Na minha casa, mesmo, dormiram uns 30 vaqueiros para participar da romaria”, revelou.
Para ele, o evento vem crescendo a cada nova edição devido à carência por uma vida melhor dos camponeses e o fortalecimento do trabalho realizado por entidades representativas que buscam mudar a realidade destas comunidades. “A gente se sente fortalecido. Aqui a luta de um é a luta de todos”, afirmou o vaqueiro.
Além do aboio, houve apresentação da banda cabaçal dos irmãos Aniceto e homenagens ao Rei do baião, Luiz Gonzaga.
O Caldeirão de Santa Cruz do Deserto foi criado a partir de doação de terras pelo padre Cícero, e da promessa de salvação pregada pelo seu fundador, beato Zé Lourenço. O local chegou a abrigar mais de duas mil famílias. Por seu legado, passou a ser referência de fé, solidariedade e esperança pelo sertanejo caririense. Segundo historiadores o povoado foi destruído, em 1937, por militares temerosos no surgimento de uma “segunda Canudos”. Centenas de pessoas foram mortas. Os sobreviventes fugiram para Estados vizinhos, como Pernambuco e Piauí.
Diário do Nordeste

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